Pode parecer piada, mas não é: o parlamento (moderno) ressurgiu, historicamente, como uma instituição revolucionária que visava a representar o povo.
Mas o que temos hoje? Um legítimo representante dos interesses populares?
Evidentemente que não. Temos, isto sim, uma corporação que mais se assemelha a uma quadrilha de peculatários e prevaricadores. Que nada tem de revolucionário. Que nada tem de popular. Que nada tem de democrático (exceto num sentido formalíssimo). E isso vale tanto para o congresso nacional (senado e câmara) quanto para as assembleias legislativas e câmaras de vereadores.
Temos, assim, atualmente, apenas uma corporação que perdeu o rumo da história. Que desconhece as condições políticas e históricas de legitimação de sua existência. E que mesmo quando atua no interesse do povo dissimula, pois o que de fato a move é a necessidade de perpetuar-se impunemente. Uma corporação que cuida, pois, de legislar em causa própria.
Parafraseando Rousseau, cabe dizer: “o povo brasileiro pensa ser livre; mas está muito enganado, pois só o é durante a eleição dos membros do parlamento; tão logo estes são eleitos, ele é escravo, é nada. Nos curtos momentos de sua liberdade, o uso que faz dela mostra bem que merece perdê-la” (Do contrato social, Livro III, Capítulo XV).
Trata-se, enfim, de uma instituição falsamente democrática, logo, falsamente representativa, e tendencialmente corrupta.
Nesse contexto, não surpreende que a Câmara dos Deputados tenha se recusado a cumprir a Constituição (art. 15, III, e 55, VI) e não cassado o mandato do deputado Natan Donadon (condenado a treze anos de reclusão por peculato, isto, é apropriação/desvio de dinheiro público), já como preparação para os parlamentares condenados na ação penal 470 (mensalão).
Como diz o provérbio (adaptado): em casa de peculatário não se fala em peculato.1
Mas, mesmo que o cassassem, a cassação não passaria de um expediente para preservar a câmara mesma. É que, no modelo atual, o que o parlamento faz, a favor ou contra o interesse público, fá-lo, em última análise, no seu próprio interesse e no interesse dos grupos econômicos que o mantém.
Apesar disso, é forçoso reconhecer que o parlamento é (ainda) um mal necessário, mas cuja reforma é imperiosa. Extinguir uma das casas (câmara ou senado, indiferentemente) já seria um bom começo.
1O provérbio diz: “em casa de ladrão não se fala em furto”.