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ORIENTAÇÕES MÍNIMAS PARA REDAÇÃO DE PEÇAS FORENSES

ORIENTAÇÕES MÍNIMAS PARA REDAÇÃO DE PEÇAS FORENSES

(VERSÃO DE JUNHO DE 2013)

Texto produzido pelos procuradores da República Gustavo Torres Soares e Bruno Costa Magalhães

  • Um bom texto é simples, claro, objetivo e gramaticalmente correto:

– simplicidade: embora obediente à língua culta, seu texto deve ser acessível, com o mínimo de erudição possível (diga “também” ou “igualmente” em vez de “outrossim”);

– clareza: fuja da ambiguidade, do “duplo sentido”, da ironia, do conteúdo implícito; seja explícito em suas idéias;

– objetividade: os juízes e tribunais têm pouco tempo; por isso, em textos jurídicos, “sendo completo, quanto menor, melhor”;

– correção gramatical: é ideal a ser perseguido por toda a vida; o único modo de se aprender gramática é, infelizmente, estudando-a; a leitura de escritores clássicos ajuda, mas não substitui o estudo da gramática.

  • Dê espaço de quatro centímetros para a margem esquerda, para evitar que a autuação dificulte a leitura da manifestação (se a impressora o permitir, imprima na frente e no verso da folha, para economizar papel; no OpenOffice, o caminho é “Formatar/Página/Layout da página/Espelhado/Ok”). Se possível, utilize a impressão do tipo “frente e verso”, mais econômica e ecologicamente correta (cuidando para que as margens sejam ajustadas).

  • Os destaques (CAIXA ALTA, negrito, sublinhado, itálico, texto recuado etc.) devem ser usados com moderação, de modo que só os elementos que realmente o mereçam sejam destacados. Exemplos: são dignos de destaque o cabeçalho (nº do processo etc.), os itens e subitens da petição, a(s) palavra(s)-chave na conclusão de tese desenvolvida na petição, o nome da demanda proposta ou ato processual praticado (ação civil pública, denúncia, promoção de arquivamento etc.), o nome das partes envolvidas (menos o do próprio MPF, que já está destacado no timbre); não necessitam de destaque o nome de testemunhas, juízes, tribunais ou autores. O destaque CAIXA ALTA, por ser muito espalhafatoso, deve ser evitado ou exclusivamente reservado para o(s) réu(s). E lembre-se: as aspas (“”) não são mero destaque, mas demonstração de citação, ironia, trocadilho, ambiguidade evidente e proposital, grande excepcionalidade, ditado popular, frase-feita ou estrutura rígida de palavras – fora desses casos, as aspas tendem a estar mal empregadas.

  • No início da manifestação, evite dizer que “o Ministério Público Federal vem expor e requerer o que se segue” ou que “o Ministério Público Federal vem se manifestar nos termos seguintes” – seja direto, desde o início: “Trata-se de requerimento de viagem internacional, formulado pelo acusado…” ou “O acusado requer, na f. 87, autorização judicial para…”. No final da manifestação, não é necessário escrever “Nestes termos, pede deferimento”, pois tal desejo de deferimento já está logicamente implícito nos pedidos e requerimentos expressamente deduzidos.

  • Nas denúncias, imediatamente após qualificar o(s) acusado(s), crie tópico denominado “Síntese da acusação” e, ali, narre, baseando-se nos dados já obtidos pela investigação, a(s) conduta(s) penalmente típica(s) a ele(s) imputada(s), com todas suas elementares, causas de aumento e, se possível, também as circunstâncias agravantes, de modo a responder: quem? Quando? Onde? O que? Como? Por que? Para que? Com quem? Contra quem?

  • Nesse(s) parágrafo(s), que é/são o núcleo da denúncia, não devem ser mencionados elementos secundários à acusação (tais como preparação do crime, investigação policial, circunstâncias da prisão etc. – isso, caso se deseje mencionar, deve ser deixado para os próximos parágrafos, sob o tópico “Histórico dos fatos relevantes”). Utilize o pretérito perfeito e a voz ativa (o acusado subtraiu, obteve, efetuou, administrou a empresa X de modo a deixar de repassar ao INSS, transportou cocaína em sua bagagem até o aeroporto, desejando levá-la para a Espanha etc.), nunca elaborando frases do tipo “teriam sido encontradas na residência do denunciado dez cédulas falsas…”. Nos casos de prisão em flagrante, é também excepcionalmente possível a utilização do pretérito imperfeito (“o acusado transportava consigo dois quilos de cocaína, motivo pelo qual foi preso em flagrante”) e até o gerúndio (“o acusado estava transportando consigo dois quilos de cocaína, motivo pelo qual foi preso em flagrante”).

  • Lembre-se: o personagem principal de sua narração acusatória é o(s) acusado(s), não o policial que o investigou/prendeu, a vítima, a principal testemunha etc. Em vez de escrever que “os agentes de Polícia Federal José e Manuel encontraram na bagagem do acusado Miguel 2 quilos de cocaína”, diga que “o acusado Miguel transportou 2 quilos de cocaína em sua bagagem até o aeroporto, desejando levá-la para a Espanha, pelo que foi preso em flagrante (…)”.

  • Outro ponto: a notícia importante, na denúncia, é o verbo típico, não eventual prisão em flagrante – é melhor dizer “o acusado transportava consigo dois quilos de cocaína, motivo pelo qual foi preso em flagrante” que dizer “o acusado foi preso em flagrante porque transportava consigo dois quilos de cocaína”.

  • Ao final da denúncia, no tópico destinado à “Conclusão”, diga que, “pelo exposto, o Ministério Público Federal imputa ao(s) acusado(s) a prática do crime previsto no art. XXX da Lei Federal nº YYY, pedindo que, após o devido processo legal, seja julgada procedente esta demanda penal e, assim, condenado(s) o(s) acusado(s) nas penas cabíveis”.

  • São problemas comumente verificados em denúncias:

– descuidado com os verbos e elementares típicos, assim como omissão de causas de aumento ou agravantes (denúncia por quadrilha na qual se narra a associação para a prática de um só crime; acusação de peculato sem narrar o vínculo do acusado com empresa prestadora de serviço para a administração pública; imputação de que “a polícia encontrou na casa do acusado vinte cédulas falsas de R$ 50,00”, em vez de se dizer que “o acusado guardava em sua casa vinte cédulas falsas de R$ 50,00”; ausência de menção ao uso de transporte público para traficar drogas);

– excessivo emprego da palavra “irregularidade”, como se fosse sinônimo exato de “crime”;

– em casos de concurso de pessoas, falta de individualização de condutas, quando tal individualização seria plenamente possível;

– falta de narração expressa do dolo;

– falta de linguagem acusatória (uso de verbos no futuro do pretérito – “o denunciado teria obtido vantagem indevida”, “a acusada teria subtraído bem da União”;

– atribuição do ônus da acusação a terceiros – “segundo relatório da polícia federal, o denunciado…”, “conforme constatado pelo IBAMA, a denunciada…”, “consta do inquérito policial que o acusado teria…”;

– confusão entre denúncia e alegações finais (exordiais com longas citações jurisprudenciais, profundas considerações sobre a exigibilidade de conduta diversa etc.);

  • nos crimes praticados através de pessoa jurídica (sonegação tributária e congêneres), é comum o uso impróprio da expressão “representante legal” (o qual, não necessariamente, tem responsabilidade criminal sobre o fato); prefira as expressões gerente, administrador, sócio-administrador ou outra que indique que o acusado tinha domínio da conduta perpetrada pela empresa;

  • em concursos de pessoas (explícitos ou não, como no caso da “mula” do narcotráfico que é processada sozinha), é frequente a menção à “participação” do acusado no crime; atenção: o termo “participação” somente deve ser usado em sentido técnico-penal (referindo-se a instigação, induzimento ou auxílio material, sem domínio finalístico do fato típico), tendo-se clareza do que é “coautoria” (maioria dos casos) e do que realmente seja “participação”; na dúvida sobre o envolvimento do acusado no grupo criminoso, denuncie-o como “coautor” e deixe tal esclarecimento para a instrução processual; prefira, portanto, expressões como “engajamento”, “prática”, “execução”, “colaboração”, “integração”, “coautoria”, em vez da – problemática – palavra “participação”.

  • Nas alegações finais de finalidade condenatória, é importante para a acusação, após dissertar sobre as provas de materialidade e autoria delitivas, discorrer sobre todas os pontos que possam aumentar a pena, no âmbito da individualização e dosimetria da sanção. Devem ser ressaltados quaisquer pontos das circunstâncias judiciais (v. art. 59 do CP), quaisquer agravantes ou majorantes que aparentem ser merecedoras de sustentação acusatória. Um exemplo: em alegações finais sobre crime de falsificação e uso de passaporte falso (arts. 297 e 304 do CP), após a demonstração da materialidade e autoria delitivas, ainda que não o réu não ostente maus antecedentes etc., é sempre possível, no mínimo, dizer:

Quanto às circunstâncias judiciais (art. 59 do CP), o MPF destaca que a falsificação e uso de passaporte falso são crimes de maior culpabilidade (reprovabilidade social) e de mais graves consequências que outras falsidades mais leves (de mero documento de registro geral, ou de cédula falsa de inscrição no CPF). Afinal, a função dos passaportes é o controle migratório internacional, de fundamental importância nos lamentáveis tempos de terrorismo e tráfico de drogas em que vivemos. Por isso, a falsificação e uso de passaporte falso causam prejuízo à segurança pública internacional, assim como à ordem internacional do trabalho (visto que vários emigrantes ilegais vão para outros países em busca de empregos clandestinos, como é o caso do denunciado) e, inevitavelmente, ao prestígio internacional do Brasil, que posa de ineficaz em seu controle migratório. Impõe-se, pois, a considerável elevação da pena-base, por conta da maior culpabilidade (reprovabilidade social) e de mais graves consequências do fato, outras falsidades mais leves.

  • Em pareceres mais complexos, divida a manifestação em relatório, fundamentação (que poderá ter subitens) e conclusão.

  • Na atuação criminal, os dois principais inimigos do Ministério Público se denominam prescrição e nulidade. Contra a prescrição, o remédio é o mais rápido possível oferecimento e recebimento judicial da denúncia (só este interrompe a prescrição, que corre velozmente durante a investigação). Para prevenir nulidades processuais, devemos sempre pensar no que a defesa poderia alegar contra cada conduta processual nossa ou do juízo – e adotá-las com o máximo de resguardo possível dos direitos fundamentais do acusado.

  • A análise das notícias-crime que chegam ao MPF é importante para que não seja dado início a investigações (ministeriais ou policiais) desnecessárias: em muitas hipóteses, é possível já oferecer denúncia (p.e., em caso de falso testemunho perante a Justiça do Trabalho, em que a testemunha afirmou fatos muito mais favoráveis ao reclamante que a própria versão deste) ou promover o arquivamento (p.e., em caso de falso testemunho perante a Justiça do Trabalho, em que as versões das testemunhas são apenas aparentemente inconciliáveis). A instauração de procedimento ministerial de investigação criminal (“PIC”) ou de inquérito policial (“IPL”) só deve ocorrer após um juízo positivo de viabilidade da investigação, ou seja, somente depois de se verificar a necessidade e possibilidade prática de o MPF ou a polícia descobrirem a materialidade e a autoria de fato típico, ilícito, culpável e punível.

  • A análise de inquéritos ainda não relatados (nos quais a polícia solicita mais prazo para terminar a apuração) é momento importante de controle externo da atividade policial. Somente podemos apor, nos autos, um carimbo de renovação do prazo se, antes, demonstramos ao delegado presidente do feito, através de manifestação individualizada sobre o caso, que o MPF está fiscalizando o trabalho dele. Por isso, nunca emita manifestação padronizada quando lhe for solicitada análise de inquérito ainda não relatado: redija, sucintamente, peça na qual você 1) diga, em um parágrafo, do que cuida aquele caso (“Trata-se de investigação sobre…, revelando-se, como principal investigado, Fulano de Tal…”); 2) faça breve avaliação crítica (positiva ou negativa) do que a polícia produziu até então (“A Polícia Federal, até agora, não avançou sequer um passo na aferição da autoria…” ou “A Polícia Federal já avançou na aferição da materialidade, mediante a confirmação de que…”); 3) se for o caso de devolução dos autos à polícia (muitas vezes é possível denunciar ou promover arquivamento em inquérito ainda não relatado), estabeleça prazo de devolução (de noventa a cento e oitenta dias, conforme a complexidade das medidas ainda pendentes); e 4) enumere as diligências específicas que se revelem promissoras (ressaltando as não promissoras) para o caso, concordando com a realização das promissoras já sinalizadas pelo delegado, recomendando a não realização das pouco promissoras em princípio pretendidas e requisitando as promissoras ainda não cogitadas nos autos.

  • Embora na capa dos autos assim esteja escrito, os feitos criminais nos quais já haja denúncia oferecida não são “ações penais”, mas processos penais”. Ação, em sentido constitucional, é o poder (direito potestativo) de provocar o Poder Judiciário sobre alegação de lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV, da Constituição da República) – uma vez exercido tal poder, a ação se converte instantaneamente em processo.

  • Pedido” e “requerimento” não se confundem. Como se depreende dos incisos III, IV e VII do art. 282 do CPC, “pedido” é o objeto (mediato) da demanda, o bem da vida buscado em juízo (determinada obrigação de fazer ou não fazer, a condenação cível ou penal de alguém etc.) e “requerimento” é todo pleito instrumental para a obtenção do pedido (a citação do demandado, a produção probatória, a redesignação de audiência etc.).

  • Casos mais comuns de uso da vírgula:

1) para separar o vocativo (destinatário), no cabeçalho de petições (é também possível o uso dos dois pontos – exemplo: “Excelentíssimo Senhor Juiz Federal,” ou “Excelentíssimo Senhor Juiz Federal:”);

2) em enumerações: “Comprei maçãs, bananas, abacates, melancias e abacaxis.”;

3) para separar termos secundários, em relação à oração principal (ressaltando que, nos termos colocados no meio da frase, denominados “intercalados”, deve haver uma vírgula antes e outra depois do termo, para isolá-lo do resto da frase): “O aluno, sempre muito atento, anotou tudo.”;

4) para ligar um verbo no gerúndio ao resto da frase: “Leia atentamente o livro, destacando as partes mais importantes.” (trata-se, na verdade, de outro modo de dizer “Leia atentamente o livro e destaque as partes mais importantes.”)

5) antes de conjunções e termos adversativos (mas, porém, todavia, contudo, entretanto, porém, apesar de); quando tais conjunções estão no começo ou intercaladas na frase, usa-se a vírgula também após: “O aluno estudou muito, mas não foi aprovado nos exames.”; “O aluno estudou muito. Não foi, porém, aprovado nos exames.”; “Apesar de ter estudado muito, o aluno não foi aprovado nos exames.”

6) a vírgula é opcional no caso de termos secundários muito pequenos (uma ou duas palavras – “O aluno atentamente anotou as lições.”), em caso de modificação do sujeito numa mesma frase (“O jovem professor de piano ainda não desconfiava que encontraria naquela tarde sua futura esposa, e essa jogava vôlei distraidamente com as amigas.”)

  • Nunca separe o sujeito do predicado com vírgula (embora seja evidente que, se houver termo intercalado – aposto, vocativo, adjunto adverbial etc. –, impõe-se o uso da vírgula antes e depois de tal termo); atente-se para a supressão de termos intercalados, a qual pode, inadvertidamente, deixar no texto vírgula indevida.

  • A abreviação para a palavra “folha” é “f.”, seja no singular, seja no plural. Por isso, evite usar “fl.” ou “fls.”. O intervalo entre folhas é designado por um hífen (-), não pela consagrada barra (/), que, rigorosamente, indica número fracionário (por exemplo: 3/5 significa “três quintos” e não “de três a cinco”). O correto é “na f. 10”, “de f. 12”, “nas f. 10-12”, “de f. 10-12”.

  • A abreviação de “número” é n. ou , não “n.º”.

  • Evitar adjetivos desnecessários, como “o ilustre Pontes de Miranda”, “o magistral ensinamento do saudoso Nélson Hungria”, “o colendo Supremo Tribunal Federal”. Exceções: a referência ao juiz ou tribunal da causa, para agradar o julgador ou amenizar crítica a ser proferida, pode ser precedida de elogio moderado (exemplo: “digno juiz”, “culto magistrado”, “douto juízo”, “egrégio tribunal” etc.)

  • O adjetivo “anexo” deve ser assim utilizado: “as provas anexas”, “o arquivo anexo”; não se deve escrever “as provas em anexo” ou “o arquivo em anexo”. Por outro lado, atente-se para a situação do documento referido: se ele figura como elemento secundário de petição ainda não juntada, ele se encontra “anexo” ou “acostado” (ou seja, nas costas), apenso ao elemento principal; se ele já está dentro dos autos, está “juntado nas f. 49-56”, “inserido nas f. 43-60”, “encartado nas f. 23-25”.

  • A expressão “sendo que”, quase sempre, é modo artificial de prolongar frase que deveria ter sido desdobrada, através de ponto e vírgula ou ponto. Em vez de dizer “dois técnicos da ANATEL identificaram a rádio clandestina, sendo que no local foram encontrados os respectivos equipamentos”, diga “dois técnicos da ANATEL identificaram a rádio clandestina; no local foram encontrados os respectivos equipamentos”.

  • A sigla “etc.” significa “et coetera” ou seja “e outros” (“e os restantes”). Por isso, como “etc.” já contém a conjunção “e”, não é correto usar “e” ou vírgula antes de tal sigla.

  • Evite a expressão “menor” (policialesca e anterior ao ECA), preferindo “criança” (até 11 anos) ou “adolescente” (entre 12 e 17 anos).

  • Ao abordar valores numéricos, dê preferência à forma por extenso. Evite, por exemplo, escrever “ele procurou o guichê de atendimento por 3 vezes”, preferindo “ele procurou o guichê de atendimento por três vezes”. Exceções:

a) expressões de valores em moeda. Nesse caso, colocar o valor em numeral (p. ex.: R$1.250,00).

b) datas: usar a forma “10.11.2006”;

c) em geral, para indicar quantidades superiores a vinte;

d) os nomes de tribunais regionais federais podem, indiferentemente, ser grafados em numeral ordinal ou por extenso (tanto é correto escrever “Tribunal Regional Federal da Terceira Região” quanto grafar “Tribunal Regional Federal da 3ª Região” – aparentemente, os TRFs até preferem a segunda forma, com numeral ordinal); e

e) claro, para fazer menção às folhas do processo.

Salvo quando o valor mereça ser destacado (por ser muito alto ou ínfimo, estranhamente coincidente ou divergente de outro valor relevante etc.). não é imprescindível escrever valor monetário por extenso – prática útil em cheques e em contratos (nos quais a possibilidade de fraude é grande), mas pouco necessária em trabalhos retóricos. Todavia, se for o caso de se escrever por extenso, a grafia de R$1.250,00 é “mil, duzentos e cinqüenta reais”, e não “um mil, duzentos e cinqüenta reais”, tampouco “hum mil, duzentos e cinqüenta reais”, formas adotadas em cheques para se evitarem golpes.

No caso de medidas precisas de massa, espaço, tempo etc., embora não seja obrigatório, costuma ser útil a redação do numeral arábico e por extenso: “1,349 g (mil, trezentos e quarenta e nove gramas)”, “3.547 m2 (três mil, quinhentos e quarenta e sete metros quadrados)”, 14h37min (quatorze horas e trinta e sete minutos).

  • Quando citar passagens do processo, fatos e documentos importantes, SEMPRE MENCIONAR AS FOLHAS em que está a informação. Isso facilita enormemente o trabalho de correção da peça e de compreensão de seu conteúdo e significado. Além de ser prova de dedicação e efetiva análise do processo. Mas ATENÇÃO: após o oferecimento das denúncias (e outras petições iniciais), pode ocorrer repaginação no Judiciário, de modo que o número de determinada folha no inquérito policial acabe sendo outro em sede judicial; uma forma de se evitar levar o julgador a erro é dizer, entre parênteses, logo no cabeçalho da denúncia:

(ATENÇÃO: Os números de página aqui mencionados se referem à ordenação dada pela Polícia Federal, de modo que poderão ser alterados após eventual repaginação judicial)

  • Veja que o art. 43 da Lei Complementar Federal nº 75/93 fala que o procurador da República é um dos “órgãos do Ministério Público Federal”. Pode parecer estranho que um procurador seja “órgão” – equiparado à corregedoria ou às câmaras de coordenação e revisão. Mas lembre a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, de que órgão não é pessoa jurídica, mas “um locus em torno do qual gravitam atribuições públicas”. Nas manifestações processuais quem fala é a instituição (o Ministério Público), que é indivisível. Prefira, então, usar “o Ministério Público Federal”, “o Ministério Público” ou “o parquet federal”. A “Procuradoria da República no Município de Guarulhos” não se manifesta processualmente, porque ela é mera estrutura administrativa. Deixemos para usar “este órgão de execução do Ministério Público Federal” ou “este procurador da República” quando quisermos ressaltar algum posicionamento particular do procurador que, em determinado processo, deva prevalecer a despeito de manifestações em contrário de colegas que falaram anteriormente no feito ou de posição consagrada e conhecida da instituição.

  • Vamos economizar nos substantivos com letra maiúscula! Eles são caros! Na língua alemã, todos os substantivos são escritos com letra inicial maiúscula. Na nossa, não! Em português, somente os substantivos próprios, as referências a Deus, os pronomes de tratamento solenes e as palavras em início de frase são grafados com inicial maiúscula! Deve-se escrever “o processo administrativo merece…”; porém “conforme se depreende do Processo Administrativo nº 7869/89…” (no primeiro caso, “processo administrativo” é substantivo comum; no segundo caso, “Processo Administrativo nº 7869/89” é substantivo próprio; o mesmo vale para “os tribunais regionais federais estão divididos…” e “conforme a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região…”; idem para “… o juiz federal de cuja decisão ora se recorre entendeu que…” e “… decisão do Exmo. Sr. Juiz Federal José da Silva, segundo o qual…”; ibidem para “os municípios do oeste paulista…” e “o Município de Guarulhos…”). É comum ver textos em que o redator escreve “… segundo o Princípio da Presunção de Inocência…”, ou “… não assiste razão ao Acusado, pois sua Defesa se baseia em…”. Não dá. O referido princípio é importantíssimo, mas é escrito com letras minúsculas: “princípio da presunção da inocência”. O acusado e sua defesa merecem todo respeito, mas são grafados com a inicial minúscula, assim como apelação, mandado de segurança, ação civil pública, juiz, desembargador, promotor e procurador (a palavra “República” tem inicial maiúscula por se tratar da abreviação de um nome próprio, “República Federativa do Brasil”). A inicial minúscula não tira o mérito das entidades ou coisas designadas. É só um exemplo, mas a regra cabe também para muitos Laudos Periciais, Autores, Réus, Autos do Processo, Intimações e Etc…

  • Quando um promotor de justiça ou um procurador da República oferece uma denúncia, todo mundo sabe que ele está fazendo “perante Vossa Excelência”, “pelo órgão que a presente subscreve”, “com o respeito e acato devidos”, “com base no incluso inquérito policial”, “com esteio no art. 129 da Constituição da República e art. 41 do Código de Processo Penal”, Ufa! Não existe a menor dúvida nisso, mas todo mundo adora escrever essas frases sacramentais pra ninguém ler. Vamos combinar que isso não é necessário. Prefira “O Ministério Público Federal oferece DENÚNCIA contra FULANO DE TAL pelos fundamentos a seguir narrados”. Vamos ser diretos, economizar tempo e espaço para o que realmente importa: os fundamentos, fáticos e jurídicos, da demanda.

  • Evite utilizar linguagem de telegrama: “Laudo pericial, f. 12-14” ou “Juntada folha de antecedentes às f. 167-170”. As orações, em geral, devem ter sujeito e predicado. Então, prefira: “O laudo pericial foi juntado nas f. 12-14”, “A folha de antecedentes foi inserida nas f. 167-170” ou “Foi encartada a folha de antecedentes nas f. 167-170”.

  • Outra impropriedade linguística: costuma-se dizer que “o laudo toxicológico foi anexado/acostado/apensado nas f. 30-33 dos autos”; rigorosamente, “anexar” significa “reunir (o que era independente) a outra coisa, considerada principal”; “acostar” remete a “costas”; e apensar é “juntar como apenso (de outra coisa, considerada principal)”; ou seja: salvo nas situações em que haja realmente a junção de feito principal e feito acessório (de modo que este foi/será anexado/acostado/apensado naquele), prefira dizer que “o laudo toxicológico foi juntado/inserido/encartado/aposto/alocado nas f. 30-33 dos autos”.

  • Dispense, ao máximo, os artigos indefinidos “um/uma/uns/umas” e os pronomes indefinidos “algum/alguma/alguns/algumas”, pois não costumam fazer falta: tanto posso dizer “o acusado encontrou uma/algumas pessoa(s) conhecida(s)”, quanto “o acusado encontrou pessoa(s) conhecida(s)”. Exatamente porque o artigo/pronome é indefinido, tal partícula costuma ser plenamente dispensável. Atenção: tal regra não se aplica a: expressões consagradas (“ele ainda demonstra um quê de perplexidade”; “por alguma razão, o acusado até aquele momento dizia que…”); aos artigos definidos (o/a/os/as) e ao numeral “um/uma/uns/umas” (“só há um motivo para…”); nesses três casos, as respectivas partículas são muito úteis (por vezes indispensáveis).

  • Evitar usar “o mesmo”, “a mesma” com função de pronome relativo. Substitua tais expressões por outros termos ou, preferencialmente, reconstrua a frase (Em vez de “o acusado alega que sua mãe, durante o período em que o mesmo estava doente, tentou…”, diga “o acusado alega que, durante o período em que estava doente, sua mãe tentou…”). Tente utilizar “o mesmo” apenas como advérbio ou adjetivo, no sentido de “igual”, “idêntico” (“O MPF, pelo mesmo motivo que impôs a decretação da prisão preventiva, agora sustenta, coerentemente, que…”).

  • Os pronomes demonstrativos este(a)(s), isto, esse(a)(s), isso, aquele(a)(s) e aquilo merecem especial atenção, pois seu emprego não é aleatório.

1) Principais usos de este(a)(s), isto e aquele/aquilo:

1.1) Quando há duas idéias e se deseja diferenciar a primeira (referida como “aquela”) da segunda (referida como “esta”). Exemplo: Os padres são como os soldados : enquanto estes lutam com as armas, aqueles usam a palavra de Deus.

1.2) Na relação escritor-leitor, “este” indica quem escreve; “esse” indica quem lê.

1.3) “Este” também indica “a presente obra”, ou seja, o objeto do seu atual trabalho.

1.4) Quando se pretende dizer algo ainda não dito, usa-se “este”. Exemplo: Os motivos da prisão são estes: a anterior fuga do acusado e sua tentativa de coagir testemunhas.

2) Principais usos de esse(a)(s), isso e aquele/aquilo:

2.1) Na linguagem oral ou nas narrações escritas, “este” indica algo próximo a quem fala; “esse” indica algo próximo a quem ouve; e “aquele” indica algo distante de quem fala e de seu interlocutor.

2.2) Quando já se disse algo (considera-se o conjunto das idéias já apresentadas um só objeto lógico) e se deseja indicá-lo, usa-se “esse(a)(s)”. Exemplo: A anterior fuga do acusado e sua tentativa de coagir testemunhas – esses são os motivos da prisão.

  • Segundo a ABNT, a forma correta de se mencionar o município e a unidade da federação é a seguinte: Guarulhos, SP – seguida ou não de vírgula, a depender do contexto. Não utilizaremos, pois, “Guarulhos/SP”, “Guarulhos/S.P.” ou “Guarulhos, São Paulo”.

  • O zero à esquerda de numerais arábicos deve ser evitado, salvo em situações em que o formato documental o imponha (p.e., Processo Administrativo nº 000286.96/2001-0025) ou a normalização da ABNT o exigir, como no caso do formato “DD.MM.AAAA” para datas (p.e., 05.08.2011 – embora, quando se aponte apenas o mês por extenso, se escreva 5 de agosto de 2011, e não 05 de agosto de 2001). Na vida prática (ou seja, fora da redação jurídica), costuma-se preencher cheques e documentos congêneres da forma 05 de agosto de 2001, para se evitarem fraudes. Nas peças jurídicas, em que as adulterações de datas e numerais são facilmente contrastáveis com elementos oficiais (chancelas de protocolo etc.), não há necessidade do “zero à esquerda”, com as ressalvas já feitas.

  • Não há necessidade de se escrever, no vocativo das petições, “EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 5ª VARA FEDERAL DE GUARULHOS – 19ª SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO, SP:”. Aqui, a referência a “São Paulo” já se reporta ao Estado Paulista, de modo que o emprego da abreviatura “SP” é inútil superfetação. Basta se escrever “EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 5ª VARA FEDERAL DE GUARULHOS – 19ª SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO:”. No caso da Capital Paulista, basta dizer: “EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 1ª VARA CRIMINAL FEDERAL DE SÃO PAULO:”.

  • Quando for mencionar determinado município/cidade, atente ao contexto. Se estiver fazendo análise jurídica, por exemplo sobre direitos e obrigações da pessoa jurídica de direito público interno, deve-se utilizar “município”.

A palavra “cidade” pode ser utilizada quando se trata de narrativa fática, em referência ao ambiente urbano de certa localidade.

  • Uma peça, por mais simples que seja, é manifestação única, autônoma. Devemos contextualizar a peça: ela tem que indicar sua razão de existir, ainda que sucintamente. Faça a pergunta: Se alguém ler a peça, isolada (e – é certo – várias pessoas a lerão isoladamente), haverá necessidade, para que ela seja compreendida, de que se consultem outras peças e documentos processuais? Se a compreensão da peça (aqui não estamos falando de construção do convencimento jurídico), se para sua simples compreensão houver necessidade de consultar outras peças processuais, é sinal de que sua peça não disse suficientemente a que veio. Por isso, evitemos dizer:

O Ministério Público Federal, em atendimento ao despacho de f. 145 e considerando o ofício de f. 143, reitera sua manifestação de f. 141, para que seja reiterado o ofício de f. 139”.

A nossa manifestação não deve forçar o leitor a se aprofundar em pesquisas para decifrar o seu significado. Deixemos essa importante tarefa para os poetas e para os correspondentes de guerra! Preferiremos nos manifestar assim, por exemplo:

O Ministério Público Federal, em atendimento ao despacho de f. 145, informa que, segundo o ofício de f. 143, emitido pela Receita Federal do Brasil em Guarulhos, o parcelamento da dívida consolidada no procedimento administrativo nº 10830.005902/2006-10, em nome da sociedade empresária PREGOS & BROCAS LTDA. está sendo regularmente cumprido.

Por isso, o MPF aguarda a vinda de novas informações sobre a cumprimento do parcelamento; caso elas não sejam trazidas aos autos em três meses, requer, desde já, para esse fim, a expedição de ofício requisitório à Receita Federal do Brasil em Guarulhos.

Com a resposta, aguarda-se nova vista, para manifestação”.

A manifestação, assim redigida, fica bem mais longa. Em contrapartida, disse absolutamente tudo o que tinha a dizer, sem meias-palavras. Em geral, com a repetição de manifestações sobre a mesma situação, sequer teremos o trabalho de elaborar a estrutura do texto – bastando cuidar das adaptações pontuais.

  • Outros exemplos: dizer cumprimento “da decisão” (você sabe qual, mas quem está lendo não sabe – deve-se, no mínimo, fazer menção à folha em que ela está e, melhor ainda, ao seu comando: “da decisão que suspendeu o processo e o curso da prescrição”); escrever “entendimento majoritário do tribunal” (sem mencionar no mínimo três acórdãos que expressem, ou pelo menos indiciem, a maioria) pode parecer embromação; dizer que o Ministério Público “concorda o disposto à f. tal e requer o prosseguimento do feito em seus ulteriores termos” pode indicar que a dita ‘folha tal’ não foi analisada coisíssima nenhuma e de que estamos mais perdidos no processo do que cego em tiroteio – porque, geralmente, quem pede que o processo siga “em seus ulteriores termos” é porque não sabe ou está com preguiça de analisar quais devem ser os próximos passos do procedimento.

Esse tópico pode ser resumido em uma palavra: se você fez a análise do processo, sua manifestação deve espelhar, ainda que sucintamente, essa análise – que inclusive servirá para as futuras consultas ao processo, como uma espécie de síntese do que foi feito até aquele ponto.

  • Todas as páginas das manifestações deverão ser numeradas, de preferência do modo como se fez neste “mini-manual”: “1/7”, “2/7”, “3/7”, “4/7”, “5/7”, “6/7” e “7/7”. Atenção: “f. 1/7” significa “página 1, dentro do total de 7”; “f. 1-7” signifca “da folha 1 à folha 7”.

  • Importante: antes de estruturar uma manifestação processual no editor de textos do computador, você tem que estruturá-la para si mesmo: ter em mente a razão pela qual os autos nos vieram com vista e os pontos que deverão ser abordados. A manifestação será a representação material da estrutura (invisível) que está na sua mente. Se a estrutura que você montou na sua cabeça é falha ou defeituosa, tenha a certeza de que a manifestação que você redigir carregará essas qualidades negativas, pois a relação entre ambas é semelhante à relação semente/fruto.

Para isso é importantíssimo a contextualização da nossa manifestação dentro do procedimento judicial (em poucas linhas se faz isso); a exposição do motivo pelo qual os autos nos vieram com vista; a exposição da nossa posição e a fundamentação (fática e jurídica) dessa posição.

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Se você tiver qualquer sugestão, comentário ou correção a fazer

a respeito destas orientações, estou acessível e à disposição!

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