De acordo com o art. 112, I, do Código Penal1, a prescrição da pretensão executória começa a correr do dia em que transita em julgado a sentença condenatória (sic). O que isso significa exatamente?
Inicialmente, é de ver que, proferida a sentença condenatória, se não houver recurso algum, seja da acusação, seja da defesa, e, pois, transitada em julgado para ambas as partes, com a consequente constituição do título executivo, o que importará, para fins prescricionais, é o dia do trânsito em julgado para a acusação, e não para a defesa, que é irrelevante.
A situação é um tanto diversa, porém, quando houver interposição de recurso da acusação e/ou da defesa, pois já agora a doutrina discute se esse trânsito em julgado da sentença para a acusação é a data em que precluiu o direito de a acusação apelar da sentença ou o dia em que precluiu o direito de recorrer, em último grau, para a instância superior, implicando o trânsito em julgado definitivo da decisão no respectivo tribunal.
Pois bem, parte da doutrina tem que o termo inicial da prescrição (executória) é o dia da preclusão do direito de apelar, e não do efetivo trânsito em julgado para as partes.
O equívoco é manifesto.
É que a prescrição da pretensão executória há de pressupor, forçosamente, o trânsito em julgado da decisão para a acusação e defesa em última instância, e não em primeiro grau (exceto, se não houver recurso algum), motivo pelo qual somente a partir do momento em que a condenação fizer coisa julgada, passar a constituir título executivo judicial e, pois, autorizar o imediato cumprimento da pena, é que se poderá cogitar de prescrição da pretensão executória.
Em suma, a prescrição em causa, que pressupõe o trânsito em julgado da decisão para ambas as partes, tem por termo inicial o dia do trânsito em julgado para a acusação em última instância.
Primeiro, porque, por força do princípio da presunção de inocência (CF, art. 5°, LVII), ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Logo, o cumprimento da pena não pode dar-se antes disso, embora o processo possa eventualmente comportar prisão provisória/cautelar.
Naturalmente que o trânsito em julgado pressupõe o exaurimento de todos os recursos possíveis da acusação e da defesa. Antes disso, não cabe falar, por conseguinte, de prescrição da pretensão executória, que pressupõe, logicamente, a constituição definitiva da sentença como título executivo judicial contra o respectivo condenado.
Além disso, não faria sentido algum que, embora vedada a execução provisória da pena contra o réu, o prazo prescricional da pretensão executória pudesse fluir de forma antecipada e normalmente. E mais, não sendo juridicamente possível a execução provisória da sentença passível ou pendente de recurso, não há cogitar de inércia da acusação e, consequentemente, de prescrição, a qual constitui, em última análise, uma forma de punição da negligência no exercício do poder punitivo.
Ademais, como falar de prescrição relativamente a uma sentença ainda passível de ser reformada e anulada, total ou parcialmente?
Enfim, se não é juridicamente possível o ato principal (execução da sentença condenatória), não o é tampouco o acessório, fluência do prazo prescricional, que o pressupõe.
Segundo, porque, a não ser assim, a lei penal estaria a fomentar a interposição de recursos com fins meramente procrastinatórios, visando à consumação da prescrição.
Terceiro, porque a decisão recorrida confunde, claramente, o trânsito em julgado da sentença (coisa julgada) com a simples preclusão do direito de apelar/recorrer.
Em síntese, o termo inicial da prescrição da pretensão executória é, realmente, o dia do trânsito em julgado da sentença para a acusação.
Mas isso não quer dizer, evidentemente, preclusão do direito de apelar, pois, ainda que tal ocorra, há sempre a possibilidade de interposição de múltiplos recursos (da acusação e da defesa) nas instâncias superiores (tribunal de justiça etc.), motivo pelo qual só depois do julgamento definitivo de todos os recursos interpostos é que se poderá cogitar de prescrição da pretensão executória, visto que só aí a sentença terá definitivamente transitado em julgado e se constituído em título executivo judicial em favor do Estado.
Não se pode, pois, confundir trânsito em julgado da sentença com preclusão do direito de apelar da sentença em primeiro grau, visto que a prescrição da pretensão executória pressupõe coisa julgada (formal e material) e a consequente constituição do título executivo judicial, além da inércia estatal. Afinal, a prescrição da pretensão executória tem por pressuposto a possibilidade legal da execução penal e a sua inexecução por desídia dos órgãos competentes.
Obviamente que a expressão sentença a que se refere o art. 112 do CP não pode ser interpretada literalmente, pois, do contrário, excluiria toda e qualquer decisão (acórdão) proferida nos tribunais, inclusive o acórdão condenatório em ação penal originária. O termo sentença deve ser entendido, por isso, como toda e qualquer decisão que importe em condenação, total ou parcial.
Em conclusão: 1)a prescrição da pretensão executória é uma forma residual de prescrição, pois pressupõe a não ocorrência de prescrição da pretensão punitiva em quaisquer de suas formas; 2)pressupõe o trânsito em julgado para ambas as partes; 3) logo, não corre enquanto não fizer coisa julgada (formal e material) para acusação e defesa; 4)apesar disso, o termo inicial é o dia do trânsito em julgado para a acusação, sendo irrelevante quando se deu o trânsito para a defesa; 5)o termo inicial não é o dia em que precluiu o direito de apelar (exceto, se não houve recurso algum das partes); 6)o termo inicial é o dia em que a decisão (sentença e/ou acordão) passou em julgado, para a acusação, na última instância (juízo ou último tribunal a apreciar recurso das partes).
1Termo inicial da prescrição após a sentença condenatória irrecorrível
Art. 112 – No caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr: I – do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional.