Não é a história que pertence a nós, mas nós que pertencemos à história. Muito mais do que nós compreendemos a nós mesmos na reflexão, já estamos compreendendo de uma maneira auto-evidente na família, na sociedade e no Estado em que vivemos. A lente da subjetividade é um espelho deformante. A auto-reflexão do indivíduo não é mais que uma centelha na corrente cerrada da vida histórica. Por isso, os pré-conceitos de um indivíduo são, muito mais que seus juízos, a realidade histórica de seu ser;
O ser que pode ser compreendido é linguagem. O fenômeno hermenêutico devolve aqui a sua própria universalidade à constituição ôntica da compreensão, quando a determina, num sentido universal, como linguagem, e determina sua própria referência ao ente como interpretação;
Não existe compreensão que seja livre de todo preconceito, por mais que a vontade do nosso conhecimento tenha de estar sempre dirigida no sentido de escapar ao conjunto de nossos preconceitos. No conjunto da nossa investigação evidencia-se que, para garantir a verdade, não basta o gênero de certeza que o uso de métodos científicos proporciona. Isso vale especialmente para as ciências do espírito, mas não significa de modo algum uma diminuição de sua cientificidade, mas, antes, a legitimação da pretensão de significado humano especial, que elas vêm reivindicando desde antigamente;
Aquele que compreende já está incluído num acontecimento em virtude do qual se faz valer o que tem sentido. Está, pois, justificado que para o jogo hermenêutico se empregue o conceito do jogo para a experiência do belo. Quando compreendemos um texto nos vemos tão atraídos por sua plenitude de sentido como pelo belo;
Na medida em que compreendemos, estamos incluídos num acontecer da verdade e quando queremos saber o que temos que crer, parece-nos que chegamos demasiado tarde;
Entender e interpretar os textos não é somente um empenho da ciência, já que pretende ao todo da experiência do homem no mundo. Na sua origem, o fenômeno hermenêutico não é, de forma alguma, um problema de método;
Compreender e interpretar são uma só e mesma coisa;
Ao se compreender a tradição não se compreende apenas textos, mas também se adquirem juízos e se reconhecem verdades;
A linguagem é o medium universal em que se realiza a própria compreensão. A forma de realização da compreensão é a interpretação;
A leitura compreensiva não é uma repetição de algo passado, mas participação num sentido presente;
Compreender um texto significa aplicá-lo a nós próprios e saber que, embora se tenha de compreendê-lo em cada caso de uma maneira diferente, continua sendo o mesmo texto que, a cada vez, se nos apresenta de modo diferente;
Onde se tratar de compreender e interpretar textos lingüísticos, a interpretação, no medium da própria linguagem, mostra com clareza o que a compreensão é sempre uma apropriação do que foi dito, de maneira que se converta em coisa própria;
Todo compreender é interpretar, e todo interpretar se desenvolve no medium de uma linguagem que pretende deixar falar e é, ao mesmo tempo, a linguagem própria de seu intérprete;
Tanto o evento do belo como o acontecer hermenêutico pressupõem fundamentalmente a finitude da existência humana;
Se nós partimos da linguisticidade da compreensão, sublinhamos a finitude do acontecer lingüístico em que se concretiza em cada caso a compreensão.
Extraídas de Verdade e Método. Petrópolis: Editora Vozes, 1999, 3ª edição. Autor: Hans-Georg Gadamer.