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Agravante de pena em razão da covid-19?

Frequentemente, juízes têm agravado a pena em virtude da covid-19 (calamidade pública), com base no art. 61, II, j, do CP, mesmo não tendo relação com o crime cometido (tráfico de drogas, roubo etc.)

No entanto, a aplicação da agravante é claramente ilegal, visto que não há relação causal entre o crime praticado e a calamidade pública.

Como se sabe, a incidência da agravante exige que o agente, ao cometer o delito, tenha se valido da maior vulnerabilidade (da vítima) causada pelo incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública, ou de desgraça particular do ofendido. A especial vulnerabilidade do ofendido implica maior culpabilidade do autor do crime.

Como escreve Hungria, “Em todos os casos, a maior periculosidade define-se pela falta de requisitos primários de solidariedade humana, pela completa ausência do senso moral. O agente, não só desatende a imperativos éticos rudimentares, como não se detém diante dos supremos espetáculos da dor e do perigo, e ainda encontra neles sugestões e estímulos para aumentar a aflição dos aflitos”. Comentários ao Código Penal. Rio: Forense, 1955, v. II, p. 299.

Consequentemente, o só fato da calamidade não atrai a incidência da agravante, pois é uma condição necessária, mas não suficiente para tanto.

Por fim, não se admite responsabilidade penal objetiva ou sem culpa, razão pela qual também por isso cumpre afastar a agravante.

E mais arbitrária será a incidência da agravante se o juiz reconhecê-la de ofício, sem provocação do MP.

Com efeito, embora o art. 385 do CPP admita o reconhecimento de agravantes de ofício (CP, arts. 61 e 62) – não causas de aumento de pena – o que é perfeitamente compreensível em se tratando de um código editado em plena ditadura Vargas, tal não é mais possível em virtude do sistema acusatório (CPP, art. 3º-A), que separa, rigidamente, as funções de acusar e julgar.

Ofende-se, ainda, a regra da correlação entre acusação e sentença, razão pela qual não deve ser admitido o reconhecimento de agravantes legais – e, com maior razão, causas de aumento de pena – sem pedido expresso da acusação.

E viola-se também o art. 10 do CPC, aplicável ao CPP (art. 3°) subsidiariamente. Segundo o art. 10 do CPP, que veda decisão-surpresa e, pois, impede o juiz de “tirar um coelho da cartola”:

“O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.”

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