Juízes e tribunais são indispensáveis num Estado de Direito: os juízes para julgar e os tribunais para reexaminar as decisões dos juízes, uma vez que a impugnabilidade das decisões do poder público (judiciais e administrativas) é essencial à democracia, que não se compraz com manifestações de poder absolutamente imodificáveis. A recorribilidade das decisões e, pois, o duplo grau de jurisdição, é irrenunciável, portanto.
Mas o processo judicial não é um fim em si mesmo, e sim um meio a serviço de um fim: a justa e pronta solução do litígio, razão pela qual as ações não podem durar indefinidamente, devendo ser julgadas num prazo de tempo razoável (CF, art. 5°, LXXVIII).
Ocorre, porém, que, segundo o modelo judicial atualmente vigente, o princípio constitucional da razoável duração do processo não passa de uma afirmação retórica grandemente inútil. Porque, de fato, com ou sem razão, com ou sem amparo legal, as partes podem procrastinar indefinidamente o julgamento das ações (cíveis e criminais), frustrando a expectativa de quem litiga de boa fé, isto é, legitimamente. Contrariamente ao provérbio, a justiça tarda e falha.
É bem verdade que a legislação processual (civil e penal) tem sido seguidamente modificada nos últimos anos, objetivando alterar esse estado de coisas. Mas o certo é que, apesar das reformas, pouco mudou no particular. É que em geral as modificações levadas a efeito são meramente paliativas, as quais, a pretexto de transformarem a realidade, criam, em verdade, as condições para que tudo permaneça como sempre foi, criando uma falsa impressão de mudança e modernização. São reformas que, apesar de necessárias, são em sua essência conservadoras ou mesmo reacionárias. E problemas estruturais demandam intervenções também estruturais.
Na verdade, se quisermos modificar substancialmente esse estado de coisas, tornando o sistema judicial minimamente eficiente, menos burocrático, oneroso e inútil, cumprirá:
1)Extinguir os tribunais superiores (STJ, TSE, TST, STM), um luxo inútil e desnecessário, quer porque fracassaram quanto à missão (impossível) de uniformizar a jurisprudência, quer porque constituem uma espécie de terceiro grau de jurisdição, quer porque suas decisões são reformáveis pelo Supremo Tribunal Federal, quer porque oneram excessiva e inutilmente os cofres públicos; 2)transformar o Supremo Tribunal Federal (STF) em tribunal constitucional, para decidir matéria específica e restrita; 3)extinguir o tribunal do júri, seja porque há muito cessaram as razões histórias que o justificavam, seja porque o julgamento dos crimes contra a vida (homicídio, aborto etc.) pode ser perfeitamente realizado pelos juízes singulares, seja porque a decisão dos jurados padece do vício insanável de desfundamentação; 4)admitir, em princípio, dois únicos recursos: agravo e apelação, proibindo os tribunais de contemplarem, em seus regimentos, outros além do que dispuser o Código de Processo a respeito; 5)extinguir o foro por prerrogativa de função (foro privilegiado), por evidente incompatibilidade com o princípio da igualdade (isonomia); 6)tornar eficientes (e ampliar) os instrumentos legais que visem a constranger as partes (juízes e promotores de justiça, inclusive) a praticar os atos processuais em tempo razoável; 7)abolir a chamada jurisdição voluntária ou graciosa, porque a intervenção do juiz num caso concreto só faz sentido diante de um conflito grave e sério entre as partes; 8)vincular/submeter a polícia judiciária ao Ministério Público, quer porque a atuação da citada polícia está orientada (constitucionalmente) para subsidiar a intervenção ministerial, quer porque tal providência afastará, grandemente, a nefasta influência (controle informal) de prefeitos e governadores sobre a atividade policial; 9)fortalecer e reestruturar a atuação dos juízes de primeira instância; 10)proceder a uma reforma substancial do estatuto da magistratura para ajustá-la à realidade atual e abolir privilégios injustificáveis (v.g., aposentadoria como pena).