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Interrogatório judicial

1)Introdução

O interrogatório judicial é um ato processual da maior relevância, já que constitui a oportunidade por excelência de o réu dar sua versão dos fatos, admitindo ou negando a acusação que lhe é feita. É um importante instrumento de defesa. Mas é também um meio de prova, uma vez que as suas declarações podem ser valoradas de modo favorável ou contrário a ele.

Antes da 11.719/2008, depois de citado dos termos da denúncia ou da queixa e apresentada a defesa prévia, o réu era intimado para o interrogatório, que era, pois, o primeiro ato da instrução. Atualmente, porém, é o último da instrução (CPP, art. 4001). O STF já decidiu, inclusive, que também nos processos especiais, militares e de competência dos tribunais o interrogatório se realizará ao final da instrução, especialmente por assegurar de modo mais amplo o direito de defesa, já que se manifestará depois de produzida a prova.

Excepcionalmente, o tribunal poderá determinar a realização de novo interrogatório no julgamento da apelação, bem como reinquirir testemunhas ou determinar outras diligências (CPP, art. 616).

2)Direito ao silêncio, dispensa do interrogatório etc.

Já vimos que, como expressão do nemo tenetur se detegere, o réu tem direito ao silêncio (CF, art. 5°, LXIII2), o qual não poderá ser interpretado em seu desfavor, nem implicará confissão. Logo, poderá nada dizer sobre o que lhe for perguntado, como também poderá responder somente ao que lhe parecer conveniente.

Também por isso, poderá requerer dispensa do interrogatório. O que de fato importa é que haja intimação pessoal, oportunizando-lhe o direito de defesa no interrogatório. A intimação da audiência de interrogatório é, pois, imperiosa, mas o comparecimento ao ato é facultativo. No procedimento do tribunal do júri, a possibilidade de dispensa do réu em plenário consta expressamente do art. 457, §2°, final, do CPP.

Já vimos também que o STF considerou não recepcionada (em parte) a condução coercitiva prevista no art. 260 do CPP, relativamente ao acusado, razão pela qual não pode mais ser compelido a comparecer em juízo para prestar depoimento. Também aqui é o direito à não autoincriminação que o ampara.

3)Sistema legal, advogado, procedimento, corréus

A presença do defensor é indispensável à audiência de interrogatório (CPP, art. 185), que poderá entrevistar-se reservadamente com seu cliente e orientá-lo, podendo formular perguntas.

Aqui vigora o chamado sistema presidencialista: o juiz realiza o interrogatório e a seguir passa a palavra às partes para que formulem perguntas por meio dele. Mas não há nulidade do ato se o juiz aplicar analogicamente o art. 212 do CPP e permitir que as partes perguntem diretamente ao acusado e faça perguntas complementares ao final3. Esse procedimento estaria mais conforme o sistema acusatório, inclusive.

No tribunal do júri é assim: as perguntas são feitas pelas partes diretamente ao réu. O Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor, nessa ordem, poderão formular, diretamente, perguntas ao acusado. Já as perguntas dos jurados são feitas por meio do juiz (CPP, 474, §1° e 2°).

A lei não exige ainda a presença do advogado no “interrogatório policial”, que se realiza na fase de investigação, embora tal fosse recomendável, a fim de assistir o investigado e prevenir, inclusive, abusos de autoridade, tortura etc. A tendência da legislação parece ser no sentido de exigir-se a assistência técnica também aqui, dada a relevância do ato e dos princípios que informam o processo penal democrático.

De todo modo, quando o preso ou indiciado estiver acompanhado de advogado, este poderá orientá-lo e formular perguntas. Afinal, a oitiva do investigado que se realiza durante o inquérito policial tomará como parâmetro o interrogatório judicial, conforme dispõe o art. 6°, V, do CPP.

Comparecendo perante a autoridade judiciária, o réu poderá admitir ou negar, no todo ou em parte, a acusação contra si formulada, podendo inclusive retratar-se enquanto não houver o julgamento do processo, retificando as declarações prestadas na polícia ou em juízo.

No caso de coautoria ou participação, associação e organização criminosas, é lícito ao advogado do correu formular reperguntas, assegurando-se os princípios do contraditório e da ampla defesa, e, com maior razão, quando se tratar de réu colaborador. Nesses casos, os acusados serão interrogados separadamente, sem que um possa ouvir o depoimento do outro.

4)Forma e fases

O interrogatório será feito de forma objetiva e clara, sem constrangimentos, abusos ou humilhações à pessoa do interrogado; tampouco é permitida a formulação de perguntas em tom de ameaça ou capciosas que induzam o interrogado a respostas incriminatórias, sob pena de invalidade do ato. O interrogatório é um ato voluntário.

E é constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos. Antes, porém, de iniciado o interrogatório propriamente dito, o réu será qualificado. Quando da qualificação não incide o direito ao silêncio. O art. 186 do CPP é claríssimo no particular:

Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas.

Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa.

Feita a qualificação, o réu será informado do direito à não autoincriminação, o qual não o isenta, contudo, de responder penalmente no caso de imputar, falsamente, crime a terceiro. Ou mesmo na hipótese de autoacusação falsa, isto é, confessar delito que não cometeu ou inexistente (CP, art. 341), conforme vimos.

Na primeira parte o interrogando será perguntado sobre a residência, meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais.

Do interrogatório deverá constar a informação sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa.

Na segunda parte o acusado será perguntado sobre: 1)ser verdadeira a acusação que lhe é feita; 2)não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que atribuí-la, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela; 3)onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta; 4)as provas já apuradas; 5)se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando, e se tem o que alegar contra elas; 6)se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido; 7)todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração; 8)se tem algo mais a alegar em sua defesa.

Após proceder ao interrogatório, o juiz indagará se restou algum fato para ser esclarecido, formulando as perguntas correspondentes se entender relevante.

Quando o interrogado não falar a língua nacional, o interrogatório será feito por meio de intérprete. Se não souber escrever, não puder ou não quiser assinar, tal fato será consignado no termo.

O interrogatório do mudo, do surdo ou do surdo-mudo será feito conforme a respectiva deficiência. Assim: a)ao surdo serão apresentadas por escrito as perguntas, que ele responderá oralmente; b)ao mudo as perguntas serão feitas oralmente, respondendo-as por escrito; c)ao surdo-mudo as perguntas e respostas serão feitas por escrito.

O interrogatório de réu que resida fora da comarca ou da seção judiciária onde tramita o processo poderá ser feito por carta precatória ou outro meio legal.

5)Réu preso

O interrogatório do réu preso será realizado em sala própria no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares bem como a presença do defensor e a publicidade do ato.

Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessária para atender a uma das seguintes finalidades: a)prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento; b)viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal; c)impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência; d)responder à gravíssima questão de ordem pública.

Da decisão que determinar a realização de interrogatório por videoconferência, as partes serão intimadas com 10 dias de antecedência.

Antes do interrogatório por videoconferência, o preso poderá acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico, a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento.

Quando não for possível a realização no estabelecimento prisional ou por videoconferência, a audiência de interrogatório poderá realizar-se no próprio juízo (fórum).

6)Confissão: conceito, espécies, efeitos

A confissão é a admissão, no todo ou em parte, da imputação penal feita na denúncia ou na queixa.

Embora não seja mais a rainha das provas, já que, como toda prova, tem valor relativo, podendo implicar tanto a condenação quanto a absolvição, há uma tendência no sentido de fazer da confissão o principal fundamento de diversos institutos, a exemplo da colaboração premiada e de diversos institutos, como o acordo de não persecução penal etc.

Diz-se simples quando o réu confessa o delito sem mais; e qualificada quando a confissão vem acompanhada de alegações de excludentes de tipicidade, de ilicitude ou de culpabilidade. Assim, por exemplo, se o interrogado afirma que praticou homicídio em legítima defesa ou que não houve estupro, mas um ato sexual consentido atípico (CP, art. 213).

Embora haja dissenso sobre se a confissão qualificada implica confissão espontânea, não vemos porque não reconhecer a atenuante também aqui. O que de fato importa é que haja confissão da materialidade e da autoria do fato e que as declarações do réu tenham sido utilizadas na sentença condenatória, nos termos da Súmula 545 do STJ.

Diz-se que a confissão é também divisível porque o acusado poderá confessar os fatos total ou parcialmente (v.g., confessa a ocultação do cadáver, mas não o homicídio).

A confissão judicial é aquela que se realiza nos autos do processo na presença do juiz; e extrajudicial quando feita durante a investigação (inquérito policial, processo disciplinar etc.) ou mesmo fora dos autos (em livro, em entrevista etc.).

A confissão extrajudicial pode dar início a uma investigação ou mesmo a um processo criminal, mas a confirmação em juízo (a confissão judicial) é essencial para convalidá-la, por força do disposto no art. 155 do CPP. Os tribunais têm, contudo, admitido a valoração da confissão extrajudicial no plenário do júri ou quando feita na presença do defensor.

Já vimos que a confissão não implica presunção de veracidade dos fatos alegados pela acusação, como ocorre no processo civil. De acordo com o art. 197 do CPP, o valor da confissão se aferirá pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e para a sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo.

O interrogatório do réu inimputável ou semi-imputável será acompanhado de curador (CPP, art. 151). As suas declarações são importantes para que o juiz, que é o peritus peritorum, verifique inclusive a própria inimputabilidade ou semi-imputabilidade.

Se o réu estiver bêbado ou drogado, é recomendável que o interrogatório seja feito tão logo ele se restabeleça, realizando-se a audiência quando estiver sóbrio, já que há de se um ato consciente e voluntário.

Havendo confissão, o réu fará jus à atenuante do art. 65, III, d, do CP. Embora o Código Penal fale de confissão espontânea, basta a confissão voluntária, não forçada.

Ainda que haja retratação, quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgado, o réu fará jus à atenuante da confissão (Súmula 545 do STJ). Logo, se o juiz afastar a confissão na sentença, seja porque inconsistente, seja porque houve retratação em juízo, a atenuante legal não incidirá. Afinal, será penalmente irrelevante.

A atenuante da confissão não é incompatível com a redução da pena pela colaboração premiada, podendo com ela coexistir.

De acordo com art. 307 do Código de Processo Penal Militar, para que tenha valor de prova, a confissão deve: a) ser feita perante autoridade competente; b) ser livre, espontânea e expressa; c) versar sobre o fato principal; d) ser verossímil; e) ter compatibilidade e concordância com as demais provas do processo.

Por fim, a Súmula 630 do STJ dispõe que: A incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico ilícito de entorpecentes exige o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera admissão da posse ou propriedade para uso próprio.

7)Pode o juiz aplicar pena abaixo do mínimo legal?

De acordo com a doutrina e a jurisprudência dominantes, inclusive do STF4, o juiz não pode fixar pena abaixo do mínimo legal, porque, se o fizer, violará o princípio da legalidade das penas, ainda que esteja presente alguma circunstância atenuante. Nesse sentido, dispõe a Súmula 231 do STJ: “A incidência de circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal.” No caso, todavia, de incidir causa de diminuição (v.g., crime tentado), a pena pode ser fixada aquém do mínimo legal.

O equívoco é manifesto, visto que: a)não é a fixação da pena abaixo do mínimo legal que viola o princípio da legalidade, mas justamente o contrário: a sua não fixação;5b)o compromisso fundamental do juiz não é com a pena mínima (ou máxima), mas com a pena justa, legal e proporcional; c)a Súmula 231 do STJ é incompatível com a reforma da parte geral do CP de 1984, que adotou o sistema trifásico de aplicação da pena e não vedou, ao contrário, obrigou o juiz a atenuar a pena (CP, art. 65).

Temos, inclusive, que mesmo que não incida no caso circunstância atenuante, é possível a aplicação de pena abaixo do mínimo legal sempre que esta for manifestamente desproporcional. Se o juiz entender, por exemplo, num caso de moeda falsa (CP, art. 289, §1°), que é inaplicável o princípio da insignificância (v.g., colocar em circulação uma única cédula de R$ 50,00), não vemos porque não possa fixá-la aquém do mínimo legal, digamos, 6 meses de reclusão (a pena mínima cominada é de 3 anos de reclusão). Só para se ter uma ideia, a pena mínima cominada ao crime de moeda falsa corresponde à pena máxima do homicídio culposo previsto no Código Penal (art. 121, §3°).

Com maior razão, justa, legal e proporcional será a aplicação da pena abaixo do mínimo legal se houver circunstância atenuante em favor do condenado6.

Com efeito, o princípio da legalidade, como de resto todos os princípios penais e processuais penais, constitui autêntica garantia política e jurídica que existe e se justifica, histórica e constitucionalmente, para proteger o acusado contra os excessos do Estado e não para justificar ações arbitrárias contra ele. Por isso é que não há falar de violação ao princípio sempre que a lei tiver de retroagir para beneficiar o réu, por exemplo, pois não há aí ofensa ao caráter garantidor que o informa. Uma garantia penal pode ser invocada em favor do acusado, não contra ele.

Aliás, é precisamente em razão desse caráter garantista do princípio que o contrário não pode acontecer, vale dizer, fixar o juiz a pena acima do máximo legal, exceto nos casos que a lei autoriza (v.g., incidência de causas de aumento de pena etc.).

Além disso, se o juiz pode o mais – absolver, em razão do princípio da insignificância, por exemplo –, há de poder o menos, evidentemente: aplicar pena aquém do mínimo legal.

A súmula 231 do STJ viola, portanto, o princípio duplamente: primeiro, porque ignora o caráter garantidor do princípio da legalidade das penas; segundo, porque ofende a letra da lei, dando-lhe interpretação contra legem, já que o art. 65 do CP dispõe expressamente: “São circunstâncias que sempre atenuam a pena…”. O artigo é, pois, claríssimo quanto à obrigatoriedade da atenuação da pena quando incidir uma ou mais circunstância prevista em lei (confissão espontânea etc.).

A vedação a priori de pena abaixo do mínimo legal importa, ainda, em violação aos princípios de isonomia e individualização, quer porque implica tratar igualmente condenados desiguais, quer porque impede a determinação de uma pena justa e proporcional.

É o que se vê, por exemplo, quando em caso de coautoria ou de participação o juiz aplica pena idêntica para todos, apesar de militar, em favor de um ou mais condenados, diversas circunstâncias atenuantes: confissão espontânea, ser o réu menor de 21 anos na data do crime etc.

No sentido aqui proposto, escreve Cézar Roberto Bitencourt7

O entendimento contrário à redução da pena para aquém do mínimo cominado partia de uma interpretação equivocada, que a dicção do atual art. 65 do Código Penal não autoriza. Com efeito, esse dispositivo determina que as circunstâncias atenuantes “sempre atenuam a pena”, independentemente de já se encontrar no mínimo cominado. É irretocável a afirmação de Carlos Caníbal quando, referindo-se ao art. 65, destaca que “se trata de norma cogente por dispor o Código Penal que ‘são circunstâncias que sempre atenuam a pena’… e — prossegue Caníbal — norma cogente em direito penal é norma de ordem pública, máxime quando se trata de individualização constitucional de pena”. A previsão legal, definitivamente, não deixa qualquer dúvida sobre sua obrigatoriedade, e eventual interpretação diversa viola não apenas o princípio da individualização da pena (tanto no plano legislativo quanto judicial) como também o princípio da legalidade estrita.

O equivocado entendimento de que “circunstância atenuante” não pode levar a pena para aquém do mínimo cominado ao delito partiu de interpretação analógica desautorizada, baseada na proibição que constava no texto original do parágrafo único do art. 48 do Código Penal de 1940, não repetido, destaque-se, na Reforma Penal de 1984 (Lei n. 7.209/84). Ademais, esse dispositivo disciplinava uma causa especial de diminuição de pena — quando o agente quis participar de crime menos grave —, mas impedia que ficasse abaixo do mínimo cominado. De notar que nem mesmo esse diploma revogado (parte geral) estendia tal previsão às circunstâncias atenuantes, ao contrário do que entendeu a interpretação posterior à sua revogação. Lúcido, também nesse sentido, o magistério de Caníbal quando afirma: “É que estes posicionamentos respeitáveis estão, todos, embasados na orientação doutrinária e jurisprudencial anterior à reforma penal de 1984 que suprimiu o único dispositivo que a vedava, por extensão — e só por extensão — engendrada por orientação hermenêutica, que a atenuação da pena por incidência de atenuante não pudesse vir para aquém do mínimo. Isto é, se está raciocinando com base em direito não mais positivo”.

Assim também Júlio Fabbrini Mirabete e Renato Fabbrini8, Rogério Greco9, Juarez Cirino dos Santos10, Andrei Schmidt11, Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini12, Fábio Roque Araújo13 etc.

De fato, como demonstra Carlos Roberto Lofego Caníbal14, antes ou depois da reforma de 1984, não havia qualquer vedação à aplicação da pena aquém do mínimo, exceção feita à atenuação especial de pena do Código de 1940. A súmula 231 do STJ está, por conseguinte, fundada numa interpretação equivocada.

As circunstâncias atenuantes eram previstas no artigo 48 do CP de 1940, cujo parágrafo único, que tinha por título Atenuação especial da pena, dispunha: “Se o agente quis participar de crime menos grave, a pena é diminuída de um terço até metade, não podendo, porém, ser inferior ao mínimo da cominada ao crime cometido”.

Como se vê, não existia proibição de a pena ser aplicada abaixo do mínimo legal quando incidisse circunstância atenuante. O que o Código de 1940 vedava era a fixação da pena aquém do mínimo legal no caso de participação dolosamente diversa, atualmente prevista no artigo 29, §2°, do CP.

Além disso, com a reforma de 1984, a atenuação especial do Código de 1940 passou a figurar no artigo 29, §2°, do CP, não mais como circunstância atenuante especial, mas como uma questão de imputação do tipo doloso (participação dolosamente diversa).

Por fim, como o STF e o STJ15 admitem, em relação ao crime do art. 273 do CP, que comina pena de 10 a 15 anos reclusão, a aplicação da Lei n° 11.343/2006, que prevê reclusão de 5 a 15 anos para o tráfico de drogas, a fim de afastar a pena mínima cominada pelo artigo 273 do CP, por ser manifestamente desproporcional, também por isso é justo superar a Súmula 231 do STJ, mantendo-se um mínimo de coerência.

1Art. 400. Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado.

2LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado.

3Art. 212.As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida.

Parágrafo único. Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a inquirição.

4RE 660537 AgR, Relator(a): Min. Luiz Fuz, primeira turma, julgado em 12/08/2014, acórdão eletrônico DJe-164 divulg 25-08-2014 Public 26-08-2014.

5Esse é o argumento principal dos autores que, como Damásio de Jesus (“O juiz pode, em face das circunstâncias atenuantes genéricas, fixar a pena aquém do mínimo legal abstrato?”, in Boletim do IBCCrim, nº 73, São Paulo, 2003), são contrários à possibilidade de as circunstâncias atenuantes reduzirem a pena abaixo do mínimo legal.

6Não sem razão, há quem proponha a abolição pura e simples da pena mínima. Nesse sentido, Ferrajoli (Derecho y razón, cit., p. 400), Edson O’Dwyer (“Se eu fosse juiz criminal”, in Boletim do IBCCrim, nº 86, São Paulo, jan. 2000) e Salo de Carvalho (Pena e garantias, cit.).

7Tratado de direito penal : parte geral. 23ª. ed. rev., ampl. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2017.

8Manual de direito penal. Parte geral. São Paulo: Atlas, 2016, p.304.

9Greco, Rogério. Código Penal Comentado. 12ª edição. rev. ampl. e atual. Niterói, RJ, 2018.

10Direito penal. Parte geral. Florianópolis: 2018, p.593/594.

11O princípio da legalidade penal no estado democrático de direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2001, p. 301-307.

12Curso de direito penal. Salvador: juspodivmeditora, 2015, p.515.

13Curso de direito penal. Parte geral. Salvador: juspodivm, 2018, p.900.

14Pena aquém do mínimo. Uma investigação constitucional penal. Revista da Ajuris, Ano XXVI, n° 77, março de 2000.

15Nesse sentido, STJ: AI no HC 239.363/PR, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, CORTE ESPECIAL, julgado em 26/02/2015, DJe 10/04/2015.

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A prescrição é a mais relevante, a mais complexa, a mais controversa e a mais frequente causa de extinção da punibilidade. Nem todos concordam com a prescrição e sempre houve quem propusesse a sua abolição total ou parcial sob a justificativa de ser um dos fundamentos da impunidade.

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