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Direito ao silencio e interrogatório abusivo

Uma das principais manifestações do princípio da não-autoincriminação (nemo tenetur se detegere) é o direito ao silêncio (CF, art. 5°, LXIII), que assegura a todo investigado ou acusado a faculdade de calar-se perante a autoridade competente ao ser interrogado, sem que isso implique confissão de culpa ou qualquer efeito incriminatório. Para fins penais, quem cala não consente.

Quando o réu ou investigado for interrogado perante a autoridade (policial, ministerial, administrativa, judicial ou parlamentar), e disser que se calará sobre o que lhe for perguntado, como deverá proceder a autoridade? Temos que deverá fazer registrar o ocorrido (recusa de responder ao interrogatório) e dar o ato por encerrado. Nada mais.

Apesar isso, alguns delegados de polícia e juízes têm dado prosseguimento ao interrogatório, formulando várias perguntas, as vezes por horas. Recentemente, isso ocorreu em depoimento perante a CPMI, inclusive.

Trata-se, claramente, de interrogatório abusivo, inútil e que configura, em tese, crime de abuso de autoridade.

Com efeito, qual o sentido de interrogar-se um investigado ou acusado que poderia inclusive se valer do direito de ausência e deixar de comparecer à audiência de interrogatório? Qual a razão de dar seguimento a um ato que representará perda de tempo e energia, inutilmente?

Um interrogatório assim realizado só faz sentido para humilhar o depoente, constrangê-lo a confessar o crime ou obrigá-lo a falar, ainda que a contragosto, ou fazer espetáculo (caso da CPMI).

Seja qual for a finalidade, cuida-se de procedimento abusivo, que viola o direito de não produzir prova contra si mesmo. E mais grave será a conduta da autoridade se o investigado ou acusado não estiver assistido por advogado ou defensor público.

Além disso, tal procedimento configura, em tese, o crime do art. 13, II e III, ou 15, parágrafo único, I, da Lei n° 13.869/2019 (Lei de Abuso de Autoridade):

Art. 13.  Constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a:

I – exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública;

II – submeter-se a situação vexatória ou a constrangimento não autorizado em lei;

III – produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro:      

Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, sem prejuízo da pena cominada à violência.

Art. 15.  Constranger a depor, sob ameaça de prisão, pessoa que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, deva guardar segredo ou resguardar sigilo:

Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único.  Incorre na mesma pena quem prossegue com o interrogatório:

I – de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio; ou

II – de pessoa que tenha optado por ser assistida por advogado ou defensor público, sem a presença de seu patrono.

Por fim, se caracterizado o constrangimento ilegal, e o depoente mudar de opinião e passar a falar ou mesmo confessar a infração penal, temos que o depoimento será inválido, tal como ocorreria se ele não fosse previamente informado desse direito.

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